Nesse sentido, a safra de alguns
destacados filósofos cristãos contemporâneos, que atuam em um âmbito
notadamente lógico e apologético, tem muito mais a dizer à filosofia cristã do
que os filósofos modernos mais famosos que os antecederam, cujas ideias foram
mais aproveitadas pelos céticos do que pela comunidade cristã que anseia por
águas vivas.
Assim, é importante combinar
originalidade, racionalidade, capacidade de apreensão do sentimento da
contemporaneidade com ousadia, ortodoxia e, principalmente, capacidade de não
ser árido, secularizado e infértil. Isso é um desafio de grandes proporções,
pois não é fácil reunir todas essas habilidades ao mesmo tempo. Muitos
filósofos e teólogos discorreram sobre assuntos cristãos com originalidade e
compreensão do sentimento de contemporaneidade, demonstrando a incrível e necessária
capacidade de renovar a linguagem, mas não foram ao essencial e parecem, no
caminho da História, ter se perdido. Outros, ao contrário, permaneceram
ortodoxos e essenciais, mas caíram no erro do fundamentalismo, que é a
incapacidade crônica de renovar a linguagem e de apreender o sentimento de
contemporaneidade, o que os torna incompreensíveis aos que vivem no mundo
atual, uma sociedade tão diferente do mundo antigo.
Quais filósofos cristãos reuniram
todas essas habilidades necessárias aqui apontadas? Poucos o fizeram.
É preciso também que se rompa com
os filósofos seculares modernos, e que se deixe de ser influenciado por aqueles
que pouco têm a contribuir para a estruturação de um pensamento cristão original
e relevante. Pois se a filosofia e a teologia cristã desenvolvidas forem “mais
do mesmo”, que importante contribuição original darão ao mundo? Há, entre os
cristãos, potencial para se desenvolver muito mais.
O fato de os citados filósofos cristãos modernos terem se perdido na História pode talvez ser explicado pelo fato de não terem vivido em uma época fácil para o Cristianismo. A comunidade cristã recebeu um grande golpe, e o humanismo radical então vigente tornou quase impossível à filosofia cristã um pensamento sereno e lúcido. Hoje, com o distanciamento do tempo, é possível, em retrospectiva, lançar um olhar mais lúcido e sereno sobre a História, e produzir uma filosofia que se oponha radicalmente à ruidosa filosofia ateísta, que é destituída de solidez metafísica e carece de sentido. Isso pode explicar, em parte, o aparente fracasso da filosofia cristã moderna, ainda que ela tenha o seu lugar e importância relativa na comunidade cristã por ter permanecido, mesmo que de forma desajeitada, corajosamente teísta.
Hoje, em filosofia cristã, a apologética está na ordem do dia, e há pensadores atuais que têm se demonstrado gigantes do pensamento ocidental, o que é uma constatação agradável às expectativas cristãs. Mas é necessário que a filosofia cristã não se limite à apologética. É necessário também que haja um maior aprofundamento na espiritualidade, bebendo-se dos místicos – essa é a necessidade maior de todas –, e que se desenvolva uma filosofia voltada para as demandas do sentimento da contemporaneidade, erigindo uma sólida Filosofia da História e uma leitura sociológica puramente filosófica.
Hoje, em filosofia cristã, a apologética está na ordem do dia, e há pensadores atuais que têm se demonstrado gigantes do pensamento ocidental, o que é uma constatação agradável às expectativas cristãs. Mas é necessário que a filosofia cristã não se limite à apologética. É necessário também que haja um maior aprofundamento na espiritualidade, bebendo-se dos místicos – essa é a necessidade maior de todas –, e que se desenvolva uma filosofia voltada para as demandas do sentimento da contemporaneidade, erigindo uma sólida Filosofia da História e uma leitura sociológica puramente filosófica.
É necessário que a filosofia
cristã torne-se relevante como nunca foi antes. É preciso superar Agostinho e
Tomás de Aquino. Será isso possível? Sejamos otimistas. Se a religião cristã é
essencialmente escatologia, por que a filosofia cristã precisa viver do
passado? Por que Agostinho e Tomás de Aquino não podem ser superados? É preciso
que a filosofia seja estimulada nas instituições cristãs como nunca foi outrora.
É necessário que as igrejas, a escola dominical, os colégios e as faculdades
cristãs sejam centros sérios de formação em ciências e em filosofia. Se não
existem instituições assim, é necessário que sejam criadas. É preciso que pensadores
cristãos surjam às centenas. E é urgente que, assim como existem inúmeros pastores,
ministros de louvor e teólogos bíblicos comprometidos com a cristologia, também
haja, do mesmo modo, vários cientistas e pensadores, e não poucos estandartes,
que caminham incompreendidos, solitários e cansados, na árdua tarefa de anunciar
uma mensagem que é pouco compreendida pelos céticos, porque falam outra língua,
e também pouco compreendida pela maioria dos cristãos, porque pouco se
interessam pela apaixonante e árdua missão acadêmica.
O Brasil vive atualmente um
período sem precedentes de divulgação popular da filosofia. Vivemos também uma era em que as pessoas clamam por espiritualidade e, desconhecendo a
profundidade da mística cristã, aderem a espiritualidades rasas e alternativas.
É preciso utilizar toda essa conjuntura a nosso favor. Aos místicos e às
profundidades da filosofia! João da Cruz, Teresa de Ávila, e tantos outros,
devem ser cuidadosamente estudados e compreendidos. E é preciso um olhar
crítico sobre a contemporaneidade, que seja profundamente acadêmico, mas também
profundamente enraizado nas águas profundas do Espírito Santo.
Jamais existiu, na verdadeira
filosofia cristã, contradição entre razão e espiritualidade. Isso é um mito moderno.
Basta ler, por exemplo, Confissões,
de Agostinho, e perceber-se-á a coesão nítida e profunda entre devoção e racionalidade.