sábado, 5 de janeiro de 2019

A ineficácia das ideologias políticas tradicionais para a crise social pós-moderna

O sucesso em exprimir corretamente questões sociais, morais e políticas reside na arte e equilíbrio de interpretar situações complexas.

Em termos de sociologia, podemos dizer que a sociedade contemporânea tornou-se complexa demais para encaixar-se em rótulos fáceis ou em ideologias simplistas. Karl Marx e Friedrich Engels tornaram-se ultrapassados, mas o mesmo ocorreu com Adam Smith e o conceito liberal de mão invisível do mercado.

A guerra ideológica hodierna, contudo, não se faz mais na área econômica, mas no campo dos costumes e na arena ética. Um exemplo é o conceito de meritocracia, tópico perfeito para render discussões acaloradas e intermináveis. O que significa, exatamente, meritocracia? Ela se aplica a todos?

O mesmo vale para temas complexos como família, pluralismo, corrupção, liberalismo, relação entre igreja e estado, democracia, ditadura, tortura, a ideia do estado paternalista e provedor, e o messianismo, tema do culto à personalidade, que é, ao meu ver, o engano maior de todos. Vivemos em um sistema democrático, sustentado pelo equilíbrio dos três poderes, e não em uma monarquia, como na Arábia Saudita. Não estamos em uma sociedade absolutista (Absolutismo, um movimento histórico europeu que se consolida no séc. XVI e termina no séc. XIX). A democracia não depende apenas do poder executivo, mas também de instituições como o poder legislativo, o poder judiciário e também de outras instituições. A figura do executivo é apenas uma parte do sistema democrático. 

Portanto, da mesma maneira que escolhemos ideologias reducionistas e simplistas para tentar interpretar problemas sociais complexos, também escolhemos ídolos, construímos personagens e instituímos o culto à personalidade. Construímos reputações que não existem, defendemos atitudes que jamais deveriam ser defendidas e criamos situações nas quais o debate não é permitido. O debate aprofundado não é permitido. Apenas estereótipos de conceitos, simulacros de valores. Para alguns, a corrupção é o pior dos crimes. Para outros, o pior ataque é à liberdade e à igualdade social. Porém, jamais vi alguém denunciando os dois erros ao mesmo tempo. Ao contrário, o equilíbrio não existe, tampouco é permitido. Quem se identifica com o centro será taxado de petista e de fascista ao mesmo tempo, respectivamente, pelas torcidas contrárias. Não há o que ser feito. Trata-se de guerras de sentimentos, algo que está além da linguagem, onde a força dos argumentos não valem segundo as regras do jogo. Vivemos em um complexo cenário no qual há poucos comentaristas políticos que realmente enxergam além do maniqueísmo conceitual e do dualismo ideológico simplista, dentre os quais eu gostaria de destacar José Álvaro Moisés e Luiz Felipe Pondé.

Deveríamos compreender que é impossível sustentar a justiça social aplaudindo a corrupção, do mesmo modo que não se deve desejar o autoritarismo para impor valores que eu defendo, mas que devem ser trazidos à tona pela autoridade dos argumentos, e não pela imposição política.

Sócrates, Ghandi, Martin Luther King e Nelson Mandela defendiam valores estruturais, e conhecemos as armas das quais eles se serviram.

Deveríamos compreender que é errado o Cristianismo impor valores de forma política e não através da autoridade dos argumentos, do mesmo modo que é errado tentar desconstruir os valores cristãos e impor um niilismo moral e liberal disfarçado de pluralismo.

Deveríamos compreender que tanto o assalto ao erário (corrupção) quanto a tortura, fantasmas que assombram a história brasileira, são errados.

Deveríamos compreender que criticar um governo é radicalmente diferente de querer o mal do Brasil.

Deveríamos compreender que na democracia todos têm o direito de expor suas opiniões, e isso é um bem irrevogável

Deveríamos compreender que tanto o marxismo quanto o neoliberalismo são teorias que não respondem mais às demandas sociais da cultura pós-moderna.

Deveríamos compreender que Karl Marx era ateu, defensor do materialismo histórico e que seu pensamento é extremamente hostil à cultura cristã ocidental.

Deveríamos compreender que a democracia, nascida na Grécia Antiga, com Péricles, a qual era defendida até mesmo com o ostracismo, é um bem inegociável, e que a Constituição não deve ser ameaçada nem mesmo indiretamente, e que a repressão que assombra o nosso passado histórico não deveria ser sequer nomeada.

Deveríamos compreender que é impossível transformar uma nação sem priorizar a educação acima de todas as demais coisas.

Deveríamos, enfim, recuperar a nossa autoestima como brasileiros, e enxergar o que existe de melhor no Brasil. Tivemos, por exemplo, um combate à corrupção que seria inimaginável há dez anos atrás. Ser político e corrupto passou a ser perigoso e deixou de ser sinônimo de impunidade em nosso país. A Lava-Jato é uma operação sem precedentes no mundo, somente equiparada à Operação Mãos Limpas, na Itália.

Enfim, vivemos na era do pluralismo. Trata-se de uma ideologia que está presente em toda a sociedade, contra qual as armas políticas são ineficientes e inócuas. A resposta à era do pluralismo não se dará na área política, mas na arena do pensamento.